quarta-feira, 26 de outubro de 2011

A Jóia de Medina


Beduínos no deserto
Meca, 619
6 anos

Foi o meu último dia de liberdade. Mas teve início mais ou menos 1.001 dias antes disso: um raio de sol e o meu grito de alarme, atrasada de novo, o salto de minha cama, a fuga pelos cômodos sem janelas da casa do meu pai, minha espada de madeira na mão, meus pés descalços batendo no piso frio de pedras, estou atrasada estou atrasada estou atrasada.
Lampiões tremeluziam sua luz fraca nas paredes, uma pobre substituta do sol que eu amava. Quando passei pela cozinha, o cheiro forte e fermentado de mingau de cevada me enjoou. Mais rápido, mais rápido. O Profeta vai chegar logo. Se ele me vir, vai querer brincar, e sentirei falta de Safwan.
Mas eu devia saber que minha mãe me encontraria. Ela era mais vigilante que o demônio.
— Aonde pensa que está indo? — gritou ela quando, no meio do caminho, dei de encontro com a parede sólida formada por seu corpo com as mãos nos quadris.
Eu ia recuar, recuperar o fôlego e contorná-la, mas ela me agarrou com mãos fortalecidas por anos fazendo pão. Seus dedos seguraram meus ombros como garras de um falcão. Ela correu os olhos como mãos rudes sobre meu cabelo emaranhado pelo sono, minha camisola cor de areia marcada como um mapa da brincadeira do dia anterior: borrões arredondados onde eu havia me ajoelhado na terra, escondendo-me de inimigos beduínos. Um rasgão na manga causado na luta contra meus captores, Safwan e nossa amiga Nadida. Manchas vermelhas do suco de romã da refeição da véspera. Riscos de poeira da pedra imensa que Safwan e eu tínhamos rolado, silenciosamente, para debaixo da janela do nosso vizinho Hamal, o mais novo recém-casado de Meca.
— Você está imunda — disse minha mãe. — Não vai sair de casa desse jeito.
— Por favor, ummi, estou atrasada! — repliquei, mas ela chamou minha irmã.
— Nenhum filho meu vai a lugar algum parecendo um animal selvagem — disse ela. — Vá vestir uma roupa limpa e se encontrar com Asma no pátio. Ela vai domar esses seus cabelos desordenados enquanto busco água para lavar o cabelo da rainha de Sabá.
Ela estava se referindo à sua irmã de harém, Qutailah. Hatun de meu pai, a "Grande Dama", ou primeira esposa, Qutailah distribuía todas as tarefas no harém. Alta, pele morena, e cada vez mais gorda, ela invejava a pele clara e as mechas ruivas e revoltas de minha mãe, além de temer seu gênio temperamental. Desse modo, Qutailah estava sempre lhe lembrando quem era a primeira na casa, chamando minha mãe de durra, ou "papagaio", o nome para a segunda esposa. E designava à minha ummi as tarefas que geralmente cabiam às criadas, tais como puxar imensos alforjes de couro cheios de água do poço de Meca. Era uma tarefa humilhante, pois o poço de Zamzam fi cava no centro da cidade e todos podiam ver minha mãe voltando para casa irritada, com os alforjes pendendo de uma vara sustentada em seus ombros estreitos, respingando água. Enfrentar esse trabalho sempre deixava minha mãe mal-humorada. Não era a hora apropriada para discutir com ela.

{Trecho do Livro: A Jóia de Medina - Sherry Jones}

Opinião: História!!! (Para quem tem curiosidade sobre a época e os costumes...) Mostra bem o papel da mulher numa sociedade em que é dominada pelos homens... Achei uma abordagem interessante sobre o Profeta Maomé... Uma leitura bem interessante

Título: Jóia de Medina, A
Subtítulo: História de Luxúria, Amor e Intriga no Hárem do Profeta, Uma
ISBN: 9788501085429
Páginas: 434
Edição: 1
Tipo de capa: BROCHURA
Editora: Record
Ano: 2009
Assunto: Literatura Estrangeira-Romances
Idioma: Português
Início: 17/09/2010
Término: 26/10/2011

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